25 de março de 2010

La Maman Et La Putain (1973)


Ontem revi o grande filme do Eustache, o La Maman et la Putain.
E?
E cada vez mais o acho brilhante. É filme de quem ama o cinema, ou melhor, de quem venera o cinema. Não é à toa que Alexandre recorre sempre ao cinema para se justificar.
Sim, isso é por demais evidente. Mas o grande valor do filme nem é esse. Para mim é mais a sinceridade com que Eustache critica uma geração, o vazio duma geração, a do pós Maio 68.
Pois, o vazio. Nem é só o vazio. Se reparares bem, La Maman et la Putain fala de utopias, de relações. Não sei se me estou a fazer entender. O vazio está lá, Alexandre é o mais puro exemplo da ociosidade, mas o filme ultrapassa isso, vai mais longe, direcciona-se para a ascensão do poder feminino. A libertinagem, a devassidão, percebes?
Sim, mas no fundo Eustache quis criticar aquela geração, isso é irrevogável.
Irrevogável é, mas não é só isso. É o colapso dessa geração com a sociedade da época, o passar do oito para o oitenta percebes? É a confusão entre o amor e o desejo, é o grito do cineasta contra a solidão. Porque o vazio que pauta toda a existência daqueles três seres não é mais do que a irrisória tentativa de fugir à solidão, à monotonia.
Ou seja, o modo de vida daquela geração, a filosofia inerente à revolução estudantil de Maio, os corpos deambulantes inseridos num ambiente de falsa liberdade…
Exacto, não é à toa que Eustache cria dois mundos…
Dois mundos?
Sim, dois mundos. Por um lado temos a rua, a cidade, as ruas de Paris, os cafés sempre cheios de falsos idealistas e moralistas. Símbolo da liberdade, liberdade essa que Eustache a retracta efémera. Por outro lado, temos o quarto, a claustrofobia que daí emana, a metáfora da opressão, da angústia. E por isso temos uma maior ocupação desse espaço quando o trio finalmente se junta, quando todos passam a comer, dormir e viver juntos. Porque Eustache quer mostrar a futilidade daquela geração, a falta de um objectivo, o caminho errante daqueles seres. Percebes? Eustache envereda pela alienação do indíviduo, pela inutilidade daquela lírica geração, a sua desconexão com a realidade.
E tudo isso leva ao vazio.
Exacto.
Concordas que este filme marca o fim da nouvelle vague?
Nem sei. Quer dizer, é uma forma de fazer cinema que passou a ser familiar a poucos cineastas. Enfim, Eustache tem sobretudo o dom da palavra, assim como Rohmer. Aliás, são dois cineastas muito semelhantes na sua forma de fazer cinema. E por isso não concordo muito com essa afirmação. Marca o declínio, como o poderá marcar também L'Amour l'après-midi do Rohmer ou o Le Diable Probablement do Bresson, mas o fim discordo, até porque não acho que a nouvelle vague tenha tido um fim.

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